A resposta para os seus problemas
Marie acabou internada até o fim de
seus dias em um manicômio, onde recebia tratamentos intensos contra seus
problemas mentais.
Nas segundas feiras, o tratamento era
a base de remédios fortíssimos, que a deixavam dopada. Às terças feiras, ela
recebia choques de alta voltagem no cérebro, como forma de uma quase tortura.
Os pacientes gemiam de dor a todo o momento naquela clínica, porém aos parentes
nada daquilo era passado. Às quartas feiras, eram feitas as visitas. A mãe de
Marie era sempre acompanhada por Pauline, que monitorava o progresso da amiga.
Às quintas feiras, todos os internos eram soltos no pátio para “brincarem”
quase que como animais, e às sextas feiras eles ficavam o dia inteiro
trancafiados no quarto para passarem o final de semana.
Com certeza aquela rotina enlouquecia
qualquer um.
***
Naquele dia, Calvin passara todos os
dias em seu escritório, administrando seus negócios. Como Marie fora internada
e Pauline não fora violentada, o homem se livrara daquelas acusações e
continuava a trabalhar normalmente, exceto pelo pedaço inferior de seus lábios
que fora arrancado por Marie naquela confusão.
No mesmo instante da cirurgia em que
ele havia passado para reconstituir os lábios, os dois homens que também haviam
sido mordidos entraram em processo cirúrgico para resolver o problema. Ao final
das contas, eles acabaram sendo recuperados juntos, os três, que viraram a mais
perigosa gangue de toda a Europa, monopolizando os manicômios do continente e
torturando pessoas lá dentro desses locais.
Era uma tarde de quinta-feira, e
Calvin estava da janela de seu escritório observando aqueles verdadeiros
“animais”(como ele assim chamava) correndo lá embaixo. Marie estava sentada no
chão, cabisbaixa e parada no mesmo lugar. Então, o homem resolveu ir ao seu
encontro.
***
Pouco tempo depois, Calvin já estava a
poucos metros de Marie, que nem sequer se mexia.
A garota usava uma camisa de força bem
apertada, e estava ajoelhada no chão, com as costas e os ombros sujos com
barro. Chovia naquele momento e o cabelo da moça era um turbilhão de lama, água
de chuva e areia. Mesmo assim, o homem não teve dó da mulher.
Ele era acompanhado de perto por dois
homens brutos, que faziam sua segurança, contudo, antes de rever Marie de perto
pela primeira vez depois do fato ocorrido, ele acabou dispensando-os.
Mais alguns passos e ele já conseguia
sentir a ofegante respiração da moça.
A chuva parou por alguns instantes.
Calvin fechou o guarda-chuva e
colocou-o escorado nas costas da mulher. Para ele, ela não passava de um objeto
qualquer. Uma escora de casacos e guarda-chuvas. Ele então se abaixou ao nível
do rosto da moça. Teve que ficar de cócoras.
Apesar de um homem estar de seu lado,
Marie não esboçou a menor reação de tê-lo percebido. Ele então cutucou-a com os
dedos. Nada.
Nesse momento, a mulher levou as mãos
ao rosto e, ainda escondidas pelos cabelos grossos, tocou seus olhos.
Calvin deu uma risada abafada pela
situação em que conseguira deixar Marie. Isso com certeza significava uma
realização para ele.
E os dois ficaram ali por longos
trinta minutos.
Calvin ficou observando atentamente a
sua ex-esposa, resumida agora à um animal qualquer. A moça continuava com as
mãos encobertas pelos longos fios de cabelo.
Então inúmeras gotas vermelhas
começaram a cair no chão, e a torrente foi somente aumentando. Agora o sangue
foi formando uma monstruosa poça embaixo do rosto da mulher.
Mais alguns minutos e Calvin
presenciara a cena mais bizarra que veria em toda a sua vida: Marie havia
retirado um de seus olhos, arrancado com a mão. E com o olho bom, ela o fitava
incessantemente. Quase que o punha em um pedestal. Para ela aquilo era um deus,
uma relíquia, uma raridade.
E o sangue continuava a jorrar
incessantemente.
A chuva recomeçou, iniciando a lavar o
piso.
Calvin riu abertamente.
Enquanto Calvin ria, Marie tentou
levantar-se. O homem ajudou-a, vendo o que ela tentaria fazer. Então, a jovem
estendeu-lhe a mão com o olho. Aqui era um presente que ela queria dar a ele.
Ela olhou bem no fundo dos olhos dele, mesmo com apenas um olho no rosto. Do
glóbulo que se encontrava intacto, algumas gotas de lágrimas rolavam até as
bochechas.
O homem estarreceu-se com o gesto de
Marie. Ele chorou uma única gota e por fim estendeu a mão para aceitar o
presente.
Exatamente nessa hora em que a
loucura dos dois se fundia por meio daquele gesto, foi ouvido um disparo de
arma de fogo.De trás de Calvin, um homem com uma carabina legítima estava com
uma expressão nem um pouco agradável.
Os loucos que estavam no pátio
corriam desesperados. O local encheu-se de seguranças e enfermeiros, mas já era
tarde demais. A bala atingiu diretamente o coração de Calvin, dilacerando-o.
Porém não foi somente isso. O projétil ultrapassou o corpo do homem e também
atingiu Marie. Apesar de não ter atingido órgãos vitais, a garota já havia
perdido muito sangue.
Os dois corpos caíram pálidos no
chão. O amor turbulento entre Marie e Calvin havia morrido junto com seus
corpos. Talvez ele já houvesse se perdido ao longo dos anos, mas agora tinha
uma chance de renascer para toda a eternidade.
Epílogo
Tempos depois, já na cadeia, o homem
que assassinara Calvin e Marie, investigado, foi condenado pela morte de
Charles e do casal. Pauline amargurou-se e acabou casando-se novamente com um
homem que mal a fazia feliz. Por fim, o manicômio foi fechado e novos métodos
de tratamento foram inventados. Com certeza, toda a Europa e todo o mundo nunca
se esquecerão da triste e melancólica história de Marie Wilheim e Calvin
Morrison: O casal que sucumbiu à loucura, mas que renasceu junto à eternidade.
E que sejam felizes para sempre.
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