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quinta-feira, 19 de maio de 2016

RESENHA - A cidade do Sol(Khaled Hosseini)

Duas garotas tentam sobreviver em uma cidade assolada pela guerra. Mas seu maior perigo não é as bombas que caem do céu, é a sociedade que as empurra para debaixo dos braços do marido.


Mariam é uma garota do interior, uma harami, uma filha bastarda de um homem rico da cidade de Herat, no Afeganistão. Em meio ao deserto e à miséria, a menina sonha com uma vida melhor; o mundo lá fora é uma maravilha aos olhos de Mariam jo. Contudo, a pobreza é um obstáculo a seus sonhos, algo que somente seu pai pode resolver.

Certo dia, quando ela completaria 15 anos, em 1974, enquanto ela conversava com o pai, decidiu que queria ir com ele assistir a um filme estrangeiro no cinema de Herat.  Porém, o que parecia ser o melhor dia de sua vida é a porta de entrada para uma nova e deprimente vida bem longe de seu local de origem.


‘Obrigada’ a se casar com um homem mais de trinta anos mais velho do que ela, mudou-se para Cabul, a capital do Afeganistão e enfurnou-se numa casa de dois andares, onde teria de passar, lavar, cozinhar e arrumar tudo, e acima de tudo: ser submissa e esconder-se debaixo de uma burca.


A liberdade de Mariam sumiu junto aos seus sonhos. Evaporaram-se e misturaram-se à poeira do deserto.


Doze anos depois, a jovem Laila está imersa em um amor juvenil com um amigo de infância , bastante alheia ao mundo ao seu redor e à guerra que se aproxima mais e mais de Cabul. Também, nunca percebeu que o clima nunca é dos mais amistosos na casa de Rashid e Mariam, seus quase vizinhos que sempre estão enclausurados e de vez em quando um ou outro grito escapa das paredes do lugar.


Novamente, um evento arrasador muda o destino de Mariam, e de certa forma o de Laila também. Quando Rashid decide salvar a pequena garota do futuro que a espera, não sabe que planta em Mariam a semente dos ciúmes, e faz com que as duas mulheres sejam separadas por um descontentamento mútuo.


Até descobrirem que juntas podem muito mais.


“Sentaram-se em cadeiras de armar e comeram a halwa com as mãos, da mesma tigela.
Tomaram mais uma xícara de chá e, quando Laila lhe perguntou se queria uma terceira,
Mariam disse que sim.


Ouviram uns disparos nas colinas, viram as nuvens deslizando diante da lua e os últimos vaga-lumes da estação formando círculos de um amarelo brilhante na escuridão. E, quando Aziza acordou chorando, e Rashid gritou para que Laila a fizesse calar, as duas mulheres se
entreolharam. Foi um olhar desarmado, de cumplicidade. E por essa comunicação rápida e
sem palavras, Laila compreendeu que elas não eram mais inimigas.”


“A cidade do sol” é um livro que incomoda quando descreve as barbaridades da guerra e da guerra que assola o Afeganistão. Mariam e Laila são apenas mais duas vítimas do sistema implantado pelo talibã, que reduz as mulheres, amedrontam-nas e as escondem debaixo dos panos pretos.


Comprei o livro pela fama que Khaled Hosseini criou em mim, quando li “O caçador de pipas” e achei que a realidade e a ficção se fundiram de tal forma como nunca antes eu havia lido. Os personagens de Hosseini são reais, dando um rosto aos milhões de afegãos mortos e refugiados pela guerra do Afeganistão, e trazendo ao mundo capitalista relativamente pacífico a realidade da guerra e de um povo que sofre pelas interpretações erradas de uma religião tão condenada e julgada, mas que no fundo somente é mal-interpretada.


A leitura flui rapidamente, e quando você vê está com os nervos à flor da pele, torcendo por Mariam e Laila como nunca antes torceu por outro personagem. E fica se perguntando a que ponto o homem pode chegar levado por uma fé cega e preconceituosa. No entanto, Khaled Hosseini não afrouxa nem por um segundo, e o final da história é emocionante, ambiguamente falando.

Mariam é um exemplo de coragem e batalha, pois conseguiu conviver com a submissão e ao mesmo tempo manter sua decência como mulher e esposa, apesar de estar mergulhada em uma sociedade que simplesmente não quer aceitar que as mulheres podem e certamente são iguais aos homens em direito. O livro traz a questão dos direitos das mulheres e da igualdade de gênero de forma tão realista e assustadora que dói saber que o drama de Mariam foi real, e mesmo que o autor não tenha utilizado fatos concretamente reais, existem muitas como ela que são segregadas e maltratadas pelos maridos, principalmente em países que seguem radicalismos religiosos, também aqueles nos quais a cultura machista infelizmente ainda impera.


Para quem gosta de uma trama envolvente, que se relaciona com temas atuais e polêmicos, mas que também entra no âmago de nossas almas e faz refletir sobre os limites a que nós mesmos nos impomos, “A cidade do sol” é o livro perfeito. Não tem como não se sentir tocado pelas cenas que nos são mostradas.


“Nosso watan chama-se agora Emirado Islâmico do Afeganistão. Eis as leis que começam a
vigorar e às quais todos devem obedecer:


Todos os cidadãos devem rezar cinco vezes ao dia. Quem for apanhado fazendo outra coisa
nas horas de oração, será espancado.


Todos os homens deverão deixar crescer a barba. O comprimento correto é pelo menos um
punho fechado abaixo do queixo. Quem não cumprir essa determinação, será espancado.


Todos os meninos devem usar turbante. Os estudantes da primeira à sexta série usarão
turbantes negros, os alunos das séries superiores usarão turbantes brancos. Todos deverão
usar trajes islâmicos. O colarinho das camisas deve ser abotoado.


E proibido cantar.


É proibido dançar.


É proibido jogar cartas, jogar xadrez, fazer apostas e soltar pipas.


E proibido escrever livros, ver filmes e pintar quadros.


Quem possuir periquitos será espancado, e os pássaros, mortos.


Quem roubar terá a mão direita cortada na altura do pulso. Quem voltar a roubar terá um
pé decepado.


Quem não é muçulmano não pode realizar seu culto em lugar onde possa ser visto por
muçulmanos. Quem fizer isso, será espancado e detido. Quem for apanhado tentando
converter um muçulmano à sua fé será executado.


Atenção mulheres:


Vocês deverão permanecer em casa. Não é adequado uma mulher circular pelas ruas sem
estar indo a um local determinado. Quem sair de casa deverá se fazer acompanhar de um
mahram, um parente de sexo masculino. A mulher que for apanhada sozinha na rua será
espancada e mandada de volta para casa.


Vocês não deverão mostrar o rosto em circunstância alguma. Sempre que saírem à rua,
deverão usar a burqa.


A mulher que não fizer isso será severamente espancada.


Estão proibidos os cosméticos.


Estão proibidas as jóias.


Vocês não deverão usar roupas atraentes.


Só deverão falar quando alguém lhes dirigir a palavra.


Não deverão olhar um homem nos olhos.


Não deverão rir em público. A mulher que fizer isso será espancada.


Não deverão pintar as unhas. A mulher que fizer isso perderá um dedo.


As meninas estão proibidas de freqüentar a escola. Todas as escolas femininas serão
imediatamente fechadas.


As mulheres estão proibidas de trabalhar.


A mulher que for culpada de adultério será apedrejada até a morte.


Ouçam. Ouçam bem. Obedeçam. Allah-u-akbar.”


Não tem como fechar os olhos para o drama de Mariam e Laila. Principalmente porque ele acontece , neste momento, em algum lugar do mundo.


por André Luiz



DADOS DO LIVRO(SKOOB)



A cidade do sol
(A thousand splendid suns)

ISBN-13: 9788520920107
ISBN-10: 8520920101
Ano: 2007 / Páginas: 364
Idioma: português
Editora: Nova Fronteira

Autor: Khaled Hosseini(foto)

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