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terça-feira, 22 de setembro de 2015

Tela azul da morte - Autodestruição



“Eu proponho... que nós façamos um robô capaz... de amar.”
William Hurt, A.I.

A luz vermelha não parava de piscar. Os olhos de Borges estavam congelados no minúsculo botão a sua frente. Conferiu em seus arquivos digitais: no mapa virtual 3D não estava modelado aquele ativador de corrente elétrica. Guardou uma das chaves de mão no cinto de trabalho e despiu-se do capuz negro que encobria sua cabeça calva e enrugada.
Acionando um de seus drones de pesquisa controlados por microchips neuroimplantados, Borges conseguiu acessar o sistema central da Companhia Municipal de Esgotos e Tratamento de Dejetos da megalópole paulistana, a Cometrad – SP. Segundo leituras iniciais, havia uma invasão de vírus na rede de controle da distribuição de fluidos, algo que estava gerando uma pressão ascendente na Portaria 2 – NORTE.
Era exatamente a informação que apontava no painel luminoso. O técnico de sistemas digitais abriu seu rastreador e conferiu as imagens captadas pela câmera frontal do drone, avançando na tubulação enferrujada.
Argh! — Borges engoliu em seco. Sentiu sua garganta envolvida de pus, como se cacos de vidro encravados na glote o fizessem grasnar. Pigarreou tal qual um velho costumava fazer.
Subitamente, a imagem na tela tremulou e se apagou. A conexão com os drones foi perdida e deixou-o surpreso frente à inusitada situação.

sábado, 12 de setembro de 2015

RESENHA - O xangô de Baker Street(Jô Soares)

Jô Soares é um jornalista respeitado e bastante polêmico. Mas é com certeza um ícone da literatura brasileira, e faz questão de imprimir sua marca nos textos que produz. Em “O Xangô de Baker Street”, mantém sua irreverência e espontaneidade, brincando com a história e a ficção de tal forma que o leitor mais atento acaba apaixonando-se pelo contexto em que Jô nos insere.

A trama se passa num Brasil imperial tentando mostrar-se modernizado, com suas vielas enormes e sua característica cosmopolita. Porém, mesmo com Dom Pedro e suas incontáveis tentativas de ressaltar os valores da terra americana, os barris de excremento carregados pelos negros africanos e as centenas de cuspideiras espalhadas pela orla não são tão agradáveis aos estrangeiros desacostumados ao fervor do Brasil.

Sarah Bernhardt é uma atriz de renome vinda da França para uma temporada de apresentações nos teatros cariocas, e causa rebuliço no povo quando passa pela avenida em seu carro aberto, ostentando fama.

Contudo, a arte que Pedro tanto buscava trazer para seu império encontra-se ameaçada pelo sumiço de Canto do Cisne, um violino Stradivarius pertencente à elite imperial e segredada a D. Pedro. Uma peça rara que encontra-se em mãos erradas.

Através desta problemática, Pedro não vê outra alternativa a não ser convocar as autoridades policiais e reportar o furto do objeto. Mas o delegado Mello Pimenta encontra dificuldades, visto que, em tese, o violino não era para existir — e o imperador sabia disso.

Ao mesmo tempo, alguém encontra uma vítima indefesa perambulando pelas ruelas da capital e resolve aproveitar-se da situação. Rasga sua garganta e deleita-se com o sangue que escorre até o chão. Sentir o cheiro da morte lhe traz sensação de dever cumprido. Um dever de louco que busca manter a todo custo. Como presente, arranca dela a orelha. Um par de recordações. Uma conta em um colar macabro. E uma corda do Stradivarius atravessada nas intimidades.

O mistério mostra-se indecifrável até mesmo para o experiente Mello Pimenta. Pedro resolve convocar, por sugestão de Sarah, o famoso detetive londrino Sherlock Holmes, que traz de companhia seu fiel escudeiro Watson. Juntos, os dois atendem ao pedido e enfrentam a viagem ao Brasil, cheios de curiosidade quanto à nova terra.

“PARA O VIAJANTE que vinha pelo mar, era um deslumbramento a vista da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Todo o litoral, adornado por uma vegetação exuberante, cobria-se de coqueiros, sapucaias, muricis e árvores jamais sonhadas por mentes europeias. Assim que o navio cruzava a barra e entrava na baía da Guanabara, entre a ilha do Governador e o Pão de Açúcar, o navegante começava a ver os bairros de Botafogo, Catete e Glória, que já mostravam algumas construções de porte. As águas ficavam coalhadas de pequenas embarcações que iam acolher os vapores, com seus marinheiros lançando gritos de boas-vindas. Entre os morros do Castelo e de São Bento, percebiam-se, ao fundo, os telhados do centro da cidade, porém o que mais chamava a atenção de quem chegava era a alvura das areias das praias.”

Assim, Jô Soares inicia uma narrativa curta da investigação sobre o paradeiro do violino e do assassino em série, não medindo esforços para prender seu leitor no mistério. Por vezes, acho que me encontro sentado ao lado de algum dos personagens, como espectador, acompanhando o desenrolar dos fatos.

O curioso do livro é que são apresentados personagens históricos e figuras ilustres de nossa terra, como D. Pedro, Olavo Bilac, Chiquinha Gonzaga, Paula Ney, Aluísio Azevedo e até mesmo as figuras de Holmes e Watson, que sempre viveram apenas no mundo da ficção. Cada um deles tem seus trejeitos, suas características bem marcantes, e certo tom caricato que acredito ser uma das marcas narrativas de Jô Soares. Juntos, os personagens dão o ar da graça ao livro e deixam-no muito mais descontraído.

Holmes é um caso a parte na trama. O detetive inglês desmonta sua elegância e pomposidade nas terras tropicais e faz questão de enturmar-se com o clima, a gente e os costumes daqui. Assim, entre feijoadas, acarajés e muita caipirinha, o inglês esbalda-se a dançar com as belíssimas mulatas e diverte-se com a excentricidade do povo brasileiro. Jô brinca com o consagrado personagem de Sir. Doyle, trazendo-o para uma perspectiva mais próxima da realidade e deixando-o mais humano. De fato, o personagem mais sombrio, misterioso e incoercível da literatura inglesa, mostra-se capaz, por exemplo, de padecer na diarreia, viciar-se na cannabis sativa e ainda arranjar tempo para apaixonar-se por uma mulata.


O público costuma condenar este livro exatamente por isso, porém entendo que o segredo é tentar imaginar que tudo aquilo deixou Holmes mais humano. Deixou-o palpável, como se tivesse realmente existido. Esta é a singularidade da narrativa de Jô Soares, com seus textos leves e que abrangem um público-alvo considerável, desde os jovens até mesmo os idosos. Afinal, é uma aventura policial histórica, mas com toda a irreverência e modernidade da literatura dos dias de hoje. 

André Luiz

***

DADOS  OBRA(SEGUNDO O SKOOB)


ISBN-10: 8571644829
Ano: 1995 / Páginas: 349
Idioma: português
Editora: Companhia das Letras

NOTA: 3,5/5

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

POESIA - Soneto imperfeito

Não vivemos em um mundo perfeito.
Não me trate como um dos seus brinquedos.
Deixe-me crescer por meio dos meus feitos.
Não quero fôrmas para meus anseios.

A vida que impõe deixa-me angustiada.
Jamais empunhe, à quem te ama, uma espada.
Se você estima tanto quanto diz,
porque insiste em me deixar infeliz?

Ao passo que busco uma alternativa,
uma rota qualquer que me leve à saída,
sofro ao pensar que serei sua inimiga.

Ambos sabemos que meu esforço é em vão
e o quão isso faz mal ao meu coração,
mas prefiro liberdade à sua prisão.

("Jéssica Stewart")

domingo, 6 de setembro de 2015

Resenha - Ninguém (Karen Alvares)

   Resolvi desta vez resenhar um conto, e sair dos autores internacionais por um tempo. A resenha de hoje é sobre o conto “Ninguém”, de Karen Alvares.

   Com uma narrativa densa e com bastante emoção empregada, a autora nos transporta para uma cena do que parece ser um afogamento. Ou melhor, um assassinato.

“Quando penso que finalmente, milagrosamente, vou morrer, ele puxa meus cabelos, sinto o cheiro de látex em suas mãos enluvadas, e então me devolve o ar, apenas para roubá-lo novamente, segundos mais tarde”

   O início do conto é eletrizante, e já ficamos curiosos por esta primeira passagem. Como este homem foi parar nas mãos daquele... hm... doutor? Sabemos que é um homem misterioso que segue nosso protagonista, mas se nem ele conhece sua face, quanto menos nós...

   O jovem que aventura-se profundamente no oceano de informações no qual estamos boiando — a internet -, pode acabar se afogando. Principalmente se encontrar um tubarão faminto e sentindo o sangue pulsando em suas veias. E, como nossos avós costumavam dizer, quem procura acha. E o protagonista sem nome –—cá entre nós, poderia ser qualquer um conectado à rede mundial de computadores ­— acaba encontrando seu tubarão. O cirurgião.

    A narrativa é leve e bastante impactante. As palavras têm zelo em sua escolha; não estão jogadas ao acaso, possuem um propósito claro. Aterrorizar. A autora preocupa-se com seu  leitor, e não poupa esforços para aumentar o clima de suspense. As luvas de látex, a história cheia de ganchos do passado e o protagonista implorando por clemência são perfeitos para o enredo. Perfeitos para quem gosta de uma boa dose de adrenalina na veia.

   Karen desenvolve mais que um conto. Uma alegoria de nossas vidas monótonas iluminadas de azul. Estamos imersos neste mar de tecnologia, afundando lentamente sem que nos demos conta disso. E “Ninguém” vem para nos mostrar que não somos nada. Não passamos de formigas tentando boiar. Basta alguém para nos desequilibrar. E manchar tudo de vermelho.

                                                                                                                                              André Luiz

DADOS DA OBRA

Nome: Ninguém
Categoria: Conto
Gênero:  Terror

O material, atualmente, (setembro/2015) encontra-se disponível gratuitamente na Amazon. Baixe-o em seu Kindle! Aproveite e compre outros trabalhos de Karen Alvares, a dama do terror nacional.


***
A AUTORA


"Karen Alvares conta histórias para o papel há tanto tempo que nem lembra quando começou. Autora de Inverso (Draco, 2015), Alameda dos Pesadelos(Cata-vento, 2014) e Dois Lados, Duas Vidas (Cata-vento, 2015), também organizou a antologia Piratas (Cata-vento, 2015) e foi publicada em várias antologias de contos da Editora Andross, Draco e Buriti, além de publicações independentes e revistas. É colunista no blog literário Por Essas Páginas e foi premiada em diversos concursos nacionais. Apaixonada por mundos fantásticos, chocolate e gatinhos, vive em Santos/SP com o marido e cria histórias enquanto pedala sua bicicleta pela cidade."


(Disponível em:https://papelepalavras.wordpress.com/sobremim/)

Será que vem novidades por aí?




sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Esperança

Fico às vezes pensando onde iremos parar.
Sou uma tola inútil,
mais uma onda em seu mar?

Prendo-me em seus olhos,
congelo em seus abraços,
escuto seu nome e abro um sorriso
mesmo que entre nós haja um grande espaço.

Vivo te esperando,
mas você nunca vem.
Ofereço meu coração
e só aceita quando lhe convém.

E você sempre responde,
ora indiferente,
ora como se me quisesse tanto quanto eu te quero.
Assim, sigo persistente.

Às vezes até me sinto contente,
mas a esperança dói e você não vê
toda chaga,
todo martírio,
todo tempo dedicado,
todo amor cativado.

A dúvida apenas fortalece o desejo de me libertar.
É tão fácil e viciante
viver só por amar.

Que seja em segredo,
esquecerei todos os meus medos.
Só preciso estar ao seu lado
e ter, por você, meu coração amado.

Afogo-me na esperança.
Sufoco-me de desejo.
Apenas dê-me um beijo,
e faça meu sofrimento cessar.

("Jéssica Stewart")

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Resenha - Fahrenheit 451



"Enquanto os livros se consumiam em redemoinhos de fagulhas e se dissolviam no vento escurecido pela fuligem. Montag abriu o sorriso feroz de todos os homens chamuscados e repelidos pelas chamas."
Fahrenheit 451 é uma obra completa, recheada de tecnologias que assustam em sua primazia. Estão imersas em nosso meio, recheadas em nossas mentes, e principalmente um cenário para o qual caminhamos ultimamente.